Em sua edição desta semana, VEJA revela como o traficante Fernandinho Beira-Mar, mesmo estado atrás das grades, segue no comando de sua milionária estrutura criminosa – e ordena sequestros e assassinatos. A história brasileira é rica em exemplos de bandidos que zombam das autoridades. Foi assim com Leonardo Pareja, em 1996. O bandido chegou a conceder entrevistas a programas de TV enquanto mantinha refém uma menina de 13 anos – sempre para zombar das autoridades que não o capturavam. Foi ele também que, diante da incompetência das autoridades, conduziu as negociações que puseram fim a uma das maiores rebeliões do país. A seguir entenda como, cada um a seu modo, Pareja e Beira-Mar riram da polícia brasileira.
Leonardo Pareja, 22 anos, o bandido da luz do flash, andava quieto desde setembro do ano passado, quando sequestrou uma menina na Bahia, passou mais de um mês escapando da polícia, ao mesmo tempo em que dava entrevistas por telefone esculhambando a ação policial. Daquela vez, entregou-se – a uma repórter da Globo – depois de se esconder por mais de um mês, e isso lhe rendeu mais reportagens. A aparição da semana passada foi bem mais curta, só durou sete dias, mas foi muito mais marcante. No mais longo motim da história policial brasileira, acabou sendo Pareja – criminoso condenado a nove anos por roubo e assalto a mão armada – quem promoveu as negociações entre presos e o governo. Acabou espetando um nariz de palhaço no rosto do governador Maguito Vilela, em todo o governo goiano e, por que não?, no do ministro Nelson Jobim, da Justiça.
Essa é a moral da história: a atuação de Pareja mostrou que se vive, nas penitenciárias brasileiras, uma situação de beira de abismo, em que as autoridades policiais e governamentais delegam a um criminoso a execução de tarefas que deveriam ser suas, como debelar uma rebelião e garantir a vida dos reféns. Na realidade, Pareja se mostrou um talento excepcional para manipular os meios de comunicação. Enquanto durou a rebelião, seu nome saiu nos jornais todas as manhãs, sempre na primeira página. Também se tornou a principal atração dos telejornais, à noite. Não há nada mais monótono do que motim em penitenciária, mas o bandido sabia como tornar a rebelião de Goiânia uma atração à parte. Ele gosta de colocar-se como uma lenda do crime e comparar-se com o criminoso Lúcio Flávio ou com o Bandido da Luz Vermelha, cujas vidas foram contadas pelo cinema. Em todas as suas ações, Pareja humilhou a polícia e o governo e só atraiu simpatia.
Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, não é um gênio do mal nem um criminoso dotado de poderes sobrenaturais, mas faz o diabo no cubículo em que está encerrado na Penitenciária Federal de Catanduvas (PR). Sob as barbas do estado, planeja, determina e supervisiona a compra, a venda e a distribuição de centenas de quilos de cocaína e maconha por mês – quando não está ocupado ordenando assassinatos, sequestros e rebeliões. Aos 43 anos, quinze dos quais passados na cadeia, Beira-Mar continua sendo o plenipotenciário líder do tráfico de drogas no país – e a prova viva e debochada da incompetência do sistema peniten¬ciá¬rio brasileiro.
Até 2007, não era possível aferir com precisão o alcance dos negócios do criminoso. Dados colhidos pela Polícia Federal (PF) na Operação Fênix, no entanto, permitiram deslindar a gigantesca estrutura de tráfico que ele comanda por intermédio do Comando Vermelho, a facção criminosa do Rio de Janeiro da qual, mesmo preso, é o líder número 1. Sua quadrilha negocia, em média, 200 quilos de cocaína e 300 quilos de maconha por mês. A cocaína é comprada no Paraguai por 5 000 reais o quilo. Essa quantidade, vendida nas favelas do Rio, seu principal centro de distribuição, rende 12 000 reais. O preço do quilo da maconha sobe de 40 reais para 500 reais. Ou seja: no total, o bandido desembolsa cerca de 1 milhão de reais e embolsa 2,5 milhões de reais – todos os meses.